segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

SAULZINHO: O DONO DO MARACANÃ


De bicicleta, Saulzinho marcou no América do México seu gol mais bonito
Por Gustavo Mariani
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Ele foi o único atacante a obter uma média de gols superior a de Pelé, nas disputas estaduais da década de 60. Principal artilheiro do Campeonato Carioca de 1962, Saul Santos Silva, o Saulzinho, iniciou a sua sina de "matador" por volta dos 12, 13 anos de idade, em um areião, onde agora fica a Igreja de Nossa Senhora Auxiliadora, em Bagé-RS, disputando uma competição interna, nas manhãs de domingo. Com 15 anos, mesmo juvenil, já jogou e fez gol pelo time profissional do Bagé. Hoje, Saulzinho é advogado, na fronteira gaúcha com o Uruguai. Foi lá que ele voltou ao passado e "balançou a rede" para o Jornal de Brasília.
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JBr – Você iniciou a carreira arrumando confusão?
Saulzinho – Eu tinha contrato de gaveta com o Bagé, mas o troquei pelo Guarany. Fiquei um ano sem poder jogar. Por volta de 1956/57, pude rolar a bola e acumular títulos municipais, até 1959. Em 60, o Guarany teve um time poderoso, vice-campeão gaúcho. Foi por ali que começou a minha história.

Como pintou o Vasco?
No início de 1961, o Guarany venceu o Internacional, duas vezes: 2 x 1, no Estádio dos Eucaliptos, em Porto Alegre, quando marquei o gol da vitória, e 4 x 2, em Bagé. No segundo jogo, não fiz gol, mas o técnico do Inter, o Martim Francisco, gostou de mim e, ao trocar o Colorado pelo Vasco, pediu a minha contratação.

O Vasco daquele tempo só tinha fera: Bellini, Orlando, Coronel, Sabará, Pinga. Como você arrumou uma vaguinha naquele time?
Cheguei a São Januário no dia 1º de abril de 1961 e, no meu primeiro treino, fiz três gols, no primeiro tempo, pelo time reserva, que tinha Brito, Maranhão e Alcir Portela. Com aquele meu feito, o presidente vascaíno, o João Silva, mandou fazer logo o meu contrato.

Quando você chegava, Vavá (Atlético de Madrid), e Almir (Corinthians) saíam. Facilitou a sua vida...
Eu era um garoto interiorano no meio de cobrões, mas fui logo me enturmando, melhorando. A concorrência era dura, pois o Vasco tinha outros três bons centroavantes: Pacoti, Wilson Moreira e um que não me lembro agora.

Como foi sua estréia?
Uma semana ou duas depois da minha chegada. Joguei só dez minutos contra o Santos de Pelé, pelo Torneio Rio-São Paulo. O Pepe fez um gol, do meio do campo, mas o Sabará empatou e o Wilson Moreira desempatou. Ganhei um salário de "bicho".

Quando você herdou a vaga de titular no Vasco?
Numa excursão à Europa, fiz 12 gols em 11 jogos, mas só virei titular no Campeonato Carioca de 1961. O meu primeiro gol, no Rio, foi sobre o Pompéia, goleiro do América. Fora do Rio, nos 3 x 1, contra o América-MG. Depois, fiz cinco gols, em Uberlândia, e dois contra o Vila Nova-GO. Também marquei conta o Atlético-GO. Em amistosos, fui me revelando o artilheiro de que o Vasco precisava.

Qual foi o seu primeiro time-base no Vasco?
Barbosa; Paulinho de Almeida, Bellini, Barbosinha e Coronel; Nivaldo e Lorico; Sabará, Saulzinho, Roberto Pinto e Da Silva (Tiriça).
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O grande ano no Vasco...
Foi 1962, quando fui o artilheiro do Campeonato Carioca, com 18 gols, em 19 jogos. Só fiquei fora de três. Eu estava cotado para a seleção brasileira que foi bi, no Chile, mas tive um problema de garganta, que exigiu cirurgia, e uma forte distensão na virilha. Esta me deixou um mês e meio parado, sem qualquer condição física para jogar.

O Dida, do Flamengo, era seu grande concorrente?
A concorrência pela artilharia era muito pesada. Tinha também o Henrique, do Flamengo, o Quarentinha, o Amoroso e o Amarildo, do Botafogo, o Rodarte, do Olaria, e muitos outros.
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E a grande glória da temporada seguinte?
No início de 63, vencemos um torneio, no México, muito famoso, na época, e eu marquei quatro gols. Goleamos Oro, o campeão nacional, por 5 x 0, e empatamos, por 1 x 1, com o Guadalajara. Jogamos, também, contra um clube argentino, contra o América, o time das massas mexicanas, e o Dukla, de Praga, que tinha o Masopust e aquela raça toda que esteve na seleção da Tchecoslováquia que pegou o Brasil na final da Copa de 62.

O seu Vasco não ganhou títulos nacionais...
Ganhamos disputas internacionais, como o Torneio Ramon de Caranza, na Espanha, o Torneio Internacional do IV Centenário do Rio de Janeiro, uma disputa no Chile, vencendo, inclusive, aquele fabuloso Peñarol, de Maidana, Sacia, Spencer, Jóia, etc., e o torneio mexicano que já me referi, o qual nenhum time estrangeiro havia ganho ainda. Em 62, não fomos campeões cariocas porque perdemos quatro pontos para o Olaria.

Que história é esta?
Levamos um olé do Olaria, dentro de São Januário. Fiz um gol, de saída, mas eles viraram, para 3 x 1, no segundo tempo. Quando jogamos na Rua Bariri, um gol de falta, no final da partida, nos liquidou. Terminamos a três pontos do campeão, o Botafogo.

No início de 1966, você deixou o Vasco e voltou para a sua terra. Por quê?
Eu estava com 28 anos, tinha convites do Benfica e do Bahia, contra o qual marquei dois gols, em um amistoso, em Ilhéus. Mas coloquei o lado familiar na frente, pois a minha mulher, também de Bagé, tinha muito medo, não se sentia bem no Rio. Então, decidi voltar.

Já que você falou no Benfica, se lembra de quê?
Em 1965, o Vasco o trouxe ao Rio, para um amistoso. Marquei um dos meus gols mais bonitos. Até olhei para o pé de onde saíra o chute, conferindo se fora verdade. Recebi um passe, dei um corte em um marcador e soltei a bomba, quase da intermediária. Eu era rápido dentro da área, mas não chuva muito forte, de longe. Foi um grande jogo, 1 x 1, com o Eusébio fazendo o gol deles.

O seu nome era muito gritado pela torcida vascaína?
Quando eu fazia gols, o Maracanã vinha abaixo. Em 1962, fui o dono da casa, sem ser jogador de rush. Mas tinha rapidez, batia bem de perto, driblava fácil e raciocinava rápido, quando estava marcado. Quando eu fazia dupla de ataque com o Célio, eu avisava: parte que vou lançar. Eu recebia a bola de costas para o ataque, tocava para ele, que tinha velocidade e, assim, fizemos muitos gols.

Como era o Sabará?
Uma figura! Brigava o jogo todo conosco e com o adversário. Xingava, pois não queria ver ninguém parado.

A sua grande partida?
Contra o Flamengo, pelo Torneio do IV Centenário do Rio, em janeiro de 1965. Fizemos 4 x 1. Outra grande? Contra o Peñarol, base da seleção uruguaia. Deixei dois.
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Você só vestiu a camisa da seleção brasileira quando voltou para o Guarany...
O Carlos Froner, técnico do Grêmio, me convocou para a seleção gaúcha que representou o Brasil na Taça O´Higgins, contra o Chile, em 1966. Joguei 30 minutos em uma partida e mais 15 na outra. Fomos campeões.

Se Pelé jogasse hoje...
Faria dois mil gols. O quarto-zagueiro e os laterais se mandam. Se, contra zagueiros plantados, fez o que fez, imagine agora. Para se entrar na área, teria que ser muito rápido, ou perdia as canelas.

Seu marcador mais difícil?
O Luís Carlos, do Flamengo. O Jadir (do Botafogo) também era duro. Chegavam junto, mas não eram desleais.

O gol mais bonito?
Contra o América, do México, em 1963. O Sabará cruzou, da direita, a bola bateu no chão, veio no meu peito, e peguei de bicicleta, antes da chegada do zagueiro. Foi capa na revista mexicana Futbol

O que pesa mais no futebol jogado hoje?
Bom preparo físico é 70%, no mínimo, do necessário para se jogar. Mas quem decide ainda é cara talentoso.

No seu tempo, ganhava-se pouco, mesmo?
Quando cheguei ao Vasco, o maior salário era o do Bellini, US$ 8 mil. Hoje, qualquer juvenil está ganhando isso.

A sua seleção brasileira...
Barbosa; Paulinho de Almeida, Brito, Fontana e Oldair; Carlinhos e Gérson; Sabará, Célio, Pelé e Zagallo. Acho que eu pegaria uma reservinha.


Publicado em: 09/12/2007

SAULZINHO, O INESQUECÍVEL ARTILHEIRO - REVISTA PLACAR DE 18/08/1986